Atravesso os corredores do Rainha, em direcção à saída. Espreito pelas portas entreabertas para ver como são as salas dezasseis anos depois. Tudo está trocado. Onde era a reprografia está a associação de estudantes; as salas de trabalhos manuais acolhem agora a informática, num óbvio sinal do tempo.
Sinto-me um intruso, um ladrão que por curiosidade bisbilhota as gavetas da casa que assalta. Estava absorto no meu voyeurismo, quando sou surpreendido com a frase os antigos alunos também podem entrar.
Levei alguns segundos até compreender a situação. Quem me surpreendeu foi uma professora, que apercebendo-se da situação me convidou a entrar. (Terei um rótulo na testa dizendo antigo aluno?) Sinto-me apanhado e declino o convite apressadamente, prosseguindo pelo corredor. A frase no entanto permanece na minha cabeça: antigo aluno. Pensei que me tinham chamado ao Liceu, para contar as peripécias de outros tempos, na qualidade de ex-aluno, mas afinal sou antigo aluno. Faz toda a diferença. Ex é aquele que foi mas já não é; é uma mudança de estado no tempo, mas num tempo não quantificado; é intemporal. Mas antigo é outra coisa, não fazendo uma quantificação precisa dá-nos uma ordem de grandeza, é um ex já com alguns anos em cima. A frase de circunstância, por definição amável, esbofeteia-me com o hiato temporal implícito. De repente apercebo-me que aquele local já não me pertence, que apenas sou dono da minha memória do local, ou, pior ainda, que sou refém da minha memória do local.
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